segunda-feira, 29 de julho de 2013

Notas de distopia

As manas falaram sobre livros. Eu vou dar-vos música.
Quando me propuseram escrever sobre a temática distópica na criação musical, um álbum surgiu-me de imediato - OK Computer, dos Radiohead. Recordei depois como é uma temática recorrente na discografia dos Pink Floyd, nomeadamente em Animals, inspirado no Animal Farm de George Orwell, ou no ainda mais marcante The Wall. Mais uma referência: "The Universal" dos Blur.
É claro que são escolhas muito pessoais. Mesmo assim, é de notar como são três criações de um período que coincide com uma queda da tendência distópica na literatura, como se pode ver no diagrama que a mana K. nos disponibilizou no seu último post.
Mas comecemos pela minha referência mais remota. Em 1979, os Pink Floyd lançam The Wall, ou seja, cinco anos antes do "futuro distópico" de George Orwell. O videoclip de "Another Brick In The Wall" está profundamente incrustado na minha memória. Vão perdoar-me mas, por uns minutos, vou entrar na máquina do tempo, de regresso à infância. "Hey, teacher, leave them kids alone!"

Pink Floyd - "Another Brick In The Wall" (The Wall, 1979)

De regresso a 2013 e aos bitter 30s, voltemos ao tema. Álbum conceptual, o protagonista de The Wall é Pink, educado sob a tirania materna e dos seus mestres, trauma atrás de trauma constrói "another brick in the wall". E é entremuros que ele se encerra depois de algum sucesso mas de ainda maiores desilusões. Num mundo paralelo, ele torna-se no tirano à imagem dos que conhecera na infância e juventude. Chegado o arrependimento, há que quebrar o muro. Estamos em 1979, e basta....
Mas saltemos a década de 80, directos aos 90. Às portas do novo milénio, todas as expectativas e alguns temores. É a tónica dos anos mil. Pouco antes, falava-se do fim da História, do triunfo da "democracia" (leia-se, do capitalismo) com a queda do muro, do termo das crises. Mas com o avançar dos 90, a teoria revela-se frágil. A sociedade de consumo, a omnipresença dos media, a volatilidade das relações pessoais são uma fissura na anunciada tranquilidade dos novos tempos. A música não o deixa em branco. É com ironia que, em 1995, Damon Alborn entoava: "This is the next century, where the universal's free".

Blur - "The Universal" (The Grate Escape, 1995)

"It really could happen", de facto. As referências à Laranja Mecânica de Kubrick no vídeoclip - do Milk Bar ao eyeliner de Alborn - reforçam o carácter distópico.
Dois anos depois, Tony Blair era eleito e o optimismo numa mudança com os Labour quase se generalizou na ilha britânica. Aliás, um optimismo na mudança que se faria sentir uma década depois, do outro lado do Atlântico.
No mesmo ano do "lançamento" de Blair, os Radiohead editavam OK Computer, questionando se o futuro que se avizinhava era, realmente, motivo para sorrisos. No fundo, não estavam à espera de grandes surpresas.


Radiohead - "No Surprises" (OK Computer, 1997)

Talvez o carácter distópico de OK Computer seja questionável. Admito. Seria, provavelmente, mais seguro falar de um tom milenarista. Talvez hoje, com os olhos de 2013 que viram torres a ruir, ditadores a morrer no Youtube, ondas a engolir ilhas, uma realidade social paralela a emergir em ecrãs movidos a dedo, seja assim. Mas em 1997, quando tudo iria ser melhor...
A. Zamperini

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