Dia 24 deste mês faz 39 anos que Werner Herzog saiu da sua casa em Munique com a missão de ir a pé até Paris. O motivo era um só:
"No final de Novembro de 1974, um amigo ligou-me de Paris a dizer-me que Lotte Eisner estava gravemente doente e que provavelmente morreria. Eu disse que não podia ser, não agora, o cinema alemão ainda não a podia dispensar, não podíamos permitir que ela morresse. Peguei num casaco, numa bússola e num saco de desporto contendo o estritamente necessário. As minhas botas eram novas e robustas, confiava nelas. Segui pelo caminho mais directo até Paris, com a firme convicção de que ela viveria se eu fosse ter com ela a pé. Queria, além disso, estar a sós comigo mesmo."
Werner Herzog, Caminhar no Gelo, Lisboa, Tinta-da-china, 2011 (ed. orig.: Vom Gehen im Eis, 1978) |
Ao longo da viagem de encontro com Lotte e, sobretudo, de encontro consigo mesmo, Werner Herzog escreveu um diário. Em princípio, este seria apenas um registo pessoal. Contudo, quatro anos após a viagem, Herzog mudou de ideias e quis partilhar a sua experiência com outros.
Não espere longas divagações. Talvez defeito profissional, Herzog concentra-se na criação de imagens e sensações com as palavras, inserindo o leitor nos cenários gélidos dos cerca de 800 quilómetros que separam Munique de Paris. Ele dirige-nos o olhar através dos caminhos enlameados, das florestas silenciosas, dos pássaros que se abrigam da chuva e dos animais que pastam nos campos gelados. Durante o percurso, assistimos à solidão de um caminhante que nem os encontros fugazes com os locais atenua. Esses não são mais do que figurantes. A outra personagem está em Paris, viva ou não. Herzog acredita que sim, é para isso que caminha, rumo a esse encontro salvífico. Afinal, este é também um relato de fé.
A. Zamperini
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