As personagens são importantes numa
história. São a quilo que a move, que nos faz ligar a elas e que nos deixam
viver naquele mundo. Algumas são escritas de forma a serem irritantes como
parte da história, da sua personalidade, do seu crescimento. Outras
simplesmente caem nessa categoria quando o autor as tenta manter fechadas numa
caracterização sem nos dar qualquer justificação ou sugestão que permita ao
leitor compreender.
Vou usar dois exemplos que encontrei nas
minhas leituras e entretenimento:
Yukine da manga (e recente adaptação para anime) Noragami (ノラガミ), série de Adachitoka, publicada pela Kodansha;
E
Calédra do volume 95 da colecção Via
Láctea O Regresso dos Deuses: Rebelião por Pedro Ventura;
Yukine: O espírito de um jovem morto,
encontrado ainda sem se encontrar corrompido nas ruas cheias de espíritos
maléficos que levam humanos ao desespero. Estes espíritos são combatidos pelos
deuses com armas sagradas hamadas Shinki. Yato, um antigo Deus da Guerra que
recentemente perdeu o seu Shinki (ela despediu-se), escolhe-o para se tornar o
seu novo Shinki.
O que o traz, de certa forma de volta à “vida”,
com idade e aparência com que tinha morrido mas agora possuindo poderes especiais
para combater monstros/evil spirits/ phantom/ Ayakashi. Nesta situação eu
andaria pular de alegria. Viver para sempre, combater monstros, magia, deuses…
Mas a personagem foi escrita para no
início ser uma peça disruptiva, cheio de ressentimento, desejando a vida que
nunca teve, roubando e magoando outros sem remorsos, sem mostrar respeito ou
gratidão quando deparado com actos de bondade para com ele, que feitos por Yato
(que geralmente disfarça sob uma fachada arrogante) ou Hiyori (uma rapariga
meio-ayakashi que tenta voltar ao normal, ajudando o par).
Foi feito para que ao mesmo tempo que
compreendemos de onde as suas acções derivam, desejo de vida, amigos, de
pequenas coisas humanas, não conseguimos manter grande simpatia porque tanto
Yato com Hiyori e onde se encontra lhe oferecem os seus desejos se ele
simplesmente aceitasse que mudou. Estas acções negativas por sua vez afectam
Yato quase ao ponto de o matar.
Yukine foi feito para ser desagradável
ao início, abrasivo, deliberadamente escrito como um alvo. Mas também foi feito
para que a personagem pudesse crescer e para que os leitores pudessem ver para
além das acções egoístas. Os leitores sabem o que se passa de ambos os lados. E
Yukine por fim cresce ao admitir o que fez mal e ao se aperceber das
possibilidades que o novo mundo lhe oferece. Como Shinki tem uma vida.
Calédra descrita como bela guerreira de
uma raça que se acredita superior, um peixe fora de água temporal, antiga
rainha, passado obscuro Portadora da Luz, destinada a salvar o mundo… MARY SUE ALERT (http://tvtropes.org/pmwiki/pmwiki.php/Main/MarySue)
(E tudo isto tirado apenas da parte de trás do livro, da sinopse. O que me levou a comprá-lo? É parte da colecção da Presença de literatura fantástica que até aquele momento pouco ou nada me desapontara. Em 95 livros não gostei de alguns mas sabia que estavam bem escritos e haviam sido lidos com interesse. Apenas os terminei e disse "bem... não é exactamente o que gosto". E ainda assim prenderam-me. Surpreendi-me com outros. Mas nenhum foi doloroso a este ponto [ver parágrafo seguinte]) ;
Vou dizer o seguinte. Estou há quase
três anos a tentar acabar este livro. Como personagem principal Calédra é-me de
tal forma insípida…
Ela aparece com alguém frio e distante,
o que seria compreensível na situação. Mas a caracterização é constante sem
nenhum indício de que haja algo mais por trás e quaisquer pistas são de
imediato caladas pela atitude da personagem ao longo de 390 páginas nem há
qualquer indício de evolução e descongelamento. Sempre a bela guerreira que
estoicamente vai salvar o mundo. Não se encontram os pontos que fariam o leitor
conectar com ela. Não se encontram os pontos que fariam os soldados “amar” o
seu general/rainha. Tudo o que o autor descreve sobre ela é apenas “habilidades
informadas”. Vemos acções e combates. Mas aquilo que se relaciona com a
personalidade de Calédra é apena dito pelas descrições. As acções não reflectem
que o autor diz que ela é.
Há personagens que são calados e
estóicos. O autor tentou dar-lhe esse arquétipo. Mas esqueceu que toda a vida
interior que esses percentagens possuem, que deve ser vista pelos leitores e subtilmente
indicada pelas acções na história. Tentou encerrar-se e tornou a personagem
numa imagem de perfeição estática e tediosa.
Há personagens que se encontram já ‘congelados’ numa
forma estática e final. Mas desses se conhecermos o seu passado e se forem, de
certa forma, secundários à trama, o que se compreende dessa forma de estar
estática é que já amadureceram, cresceram, sabem aquilo que desejam e precisam.
Mas isso é mostrado para além de descrito.
Se querem uma
rainha olhem para Daenerys Targaryen;
Se
querem uma guerreira olhem para Dangeruese St. Richard ou Katniss
Everdeen;
Se
querem personagens femininas poderosas mas de diferentes personalidades e
capacidades procurem Erza Scarlet (http://www.youtube.com/watch?v=GcUplzOOMRE)
e Mirajane Strauss (http://www.youtube.com/watch?v=6cJxm8EBsto)
da anime/manga Fairy Tail.
Sabine
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